
5 dias veganos - uma experiência de Manuela Mancilla
Não me lembro com clareza quem teve a ideia de realizar essa experiência. Só recordo que não relutei em me voluntariar. O porquê? Não sei. Das quatro integrantes do grupo, sou a que mais gosta de comer alimentos opostos ao do cardápio, e estilo de vida, vegano.
Confesso que adoro uma picanha bem passada, um queijo derretido no misto quente e um pedacinho de chocolate todo dia. Sou chocolover mesmo. Então, de novo: por quê? Talvez porque queria conhecer o meu limite desse admirável mundo do novo que é o veganismo.
Sei que aguento um saco de Ruffles, porções de amendoim japonês e cinco pedaços de pizza em uma noite. O desafio era fazer o inverso: ingerir refeições desprovidas disso, vestir o mínimo de roupas, sapatos, até acessórios de couro e cosméticos que não testassem em animais, ou ainda tivesse-os na composição.
Procrastinei a data para iniciar esse desafio. Enrolei por duas semanas e até diminui a quantidade de dias: de sete passou para cinco. Sinceramente, estava apreensiva, achei que não conseguiria. Mas, já dou-lhe um spoiler: c-o-n-s-e-g-u-i!
Então, dá um play para conferir as ciladas (exagero meu), em que me meti. E não deixe de ler as considerações finais de toda a experiência – você vai se surpreender
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Dia 1
As histórias de “primeiras vezes” costumam ser ruins. Em contrapartida a esse senso comum, o meu primeiro dia vegano não foi sofrido. Tá, perdi a oportunidade, lá no trabalho, de comer um pão de queijo quentinho, oriundo de um coffee break. Deu um aperto no coração? Deu. Mas, sobrevivi.
Como almocei todos os dias no restaurante do trabalho - por motivos de: não ter um carro, nem capital suficiente para frequentar um legítimo restaurante vegano - fiquei à mercê do estoque e da imaginação da nutricionista da firma. Ao longo da semana, pedi somente a opção “dieta”, porque era mais nutritiva – tem até arroz integral- e vinha mais opções de mistura. Sim, comi demais.
Comi tanto que até me senti enjoada.
E esse era o momento de experimentar comidinhas novas. Algumas, até gostei; por exemplo, a abóbora e a prima dela, a abobrinha. Já a berinjela... paguei meus pecados levando isso para o meu estômago. Mas, acredito que a pior parte mesmo foi tirar a foto dos pratos.
Sério, por mais que eu seja muito “cara de pau”(reconheço), tirar o celular do bolso e clicar a refeição do dia, como uma vlogueira – aliás, têm o meu máximo respeito demais dessa semana- foi torturante. Que vergonha, que vontade de cavar um buraco e esconder meu rosto lá e só desenterrar no final da semana.
Para finalizar o dia, só afirmo que: não passei fome. Como eu comia a cada três horas - meu relógio biológico apitava- não sentia uma vontade avassaladora de me alimentar. Nem tive fraqueza. Comia mesmo: santa marmita com frutas e snaks que não me deixou na mão! Planejamento é t-u-d-o, não?
Dia 2
Pensei: “se sobrevivi ao 1º dia, o segundo será tranquilo”. E realmente foi. Segui a rotina do dia anterior. A diferença, que comecei a notar já na segunda-feira à noite, foi o sentimento de leveza. Passei a perceber uma sensação de desinchaço muito grande. Na barriga, nos braços... Meu rosto que o diga: até ele foi afetado. Minhas espinhas diminuíram e os cravinhos também. Não tanto, mas era possível notar algo de singular.
Acreditei que meu corpo pediria leite, manteiga, queijo... Mas, não. Tanto no trabalho, com várias matérias para produzir, quanto na faculdade, com apresentação de texto no dia seguinte, não recorri a comida para sanar a ansiedade nem o stress.
Resumo do dia: ok. E dormi com o seguinte pensamento na cabeça: não é que não estou surtando? Se pensar bem, já tinha algumas refeições veganas e não percebia: no café da manhã, comia às vezes pão de sal ou integral com geleia e uma caneca de chá preto. No almoço, seguia o cardápio da firma – e sim, tem opções, apesar de alguns legumes terem se repetido. À tarde, comia frutas, snaks ou combo banana+granola. E à noite, tapioca com alguma coisa ou pão com alguma coisa. Enfim, não passei fome.
Diferentemente de ontem, não mantive a compostura. Não mesmo. Uma correria sem fim, na firma e na faculdade, mas calma: não ingeri nenhum derivado de bichinhos.
Comi de manhã meu combo sagrado, banana + granola, e novamente, resisti a tentação do pão de queijo na cobertura de um evento da firma. No almoço, passei pela maravilhosa sensação de não ter que tirar foto do meu prato por dois motivos: a gerente da minha área, a qual vejo pontualmente, estava na mesa (não queria que ela pensasse o quão doida eu era). E segui para o lado contrário, no restaurante, de onde costumo comer, onde é mais povoado e barulhento. Sou estagiária e universitária, mas ainda preservo a minha dignidade.
Cheguei em casa e preparei uma marmita equipada para acampar dias na PUCC: maçã, lanchinho de alface com cenoura e mais snaks. Na verdade, ficaria até as 10h30 da noite para apresentação do trabalho. Dramática? Imagina. O volume desesperador de assuntos para resolver e a falta dos laticínios, principalmente, começaram a me deixar irritada. O queijo e o chocolate (nem leite com Nescau, gente!) começaram a fazer falta. Afinal, não pude recorrer a minha válvula de escape da irritação: um belo docinho no fim da noite.
Resumo do dia: ainda bem que a semana vegana estava acabando. O que balanceava a minha impaciência era o sentimento de leveza e a pele pêssego que meu rosto tomou forma nos últimos dois dias.
Dia 3
Dia 4
Depois de três dias, além dos benefícios para minha pele e bem-estar mencionados anteriormente, a paciência restante em mim era mínima. Não era só o meu psicológico que pedia um queijinho ou vitamina B12: meu corpo também, talvez.
Foi o primeiro e único dia em que fiquei doente. Reforço: consegui levantar da cama, então não era uma sensação de fraqueza, a qual me incapacitava de trabalhar ou estudar. Só sei que estava como rainha no trono do meu banheiro. Não compreendi o real motivo até hoje, mas eu estava lá. Talvez seja a ansiedade ou o nervosismo. Talvez.
Com relação à alimentação, nada de diferente. Era a mesma comida sempre, com exceção ao almoço, então cheguei a um ponto em que meu corpo estava 75% acostumado. Mas, confesso: meu paladar estava enjoado.
Achei que aguardaria com mais vontade esse dia. Pensei que estaria louca para abocanhar um X-salada com cheedar quando os ponteiros do relógio batessem 00h – tipo uma Cinderela da comida. Mas, não. Acredita que acostumei? Apesar das irritações do dia anterior persistirem, a origem delas estava mais conectada com a rotina, com as entregas na faculdade, do que com o desafio em si. A sensação de leveza compensava e minha pele agradecia.
O ponto fraco mesmo era o chocolate. Nesse dia, minha chefe trouxe espacialmente para mim (ela sabe que sou esfomeada) uma BARRA de chocolate com castanha. Foi uma tentação, mas eu aguentei firme. Tanto a minha gestora, quanto a minha colega estagiária, disseram: “Você já aguentou uma semana. Não tem problema, já tá acabando”. E eu falei não. Não desisti e persisti.
Seguiu com o almoço, o lanche da tarde e a janta. Os minutos para a meia-noite estavam se aproximando e a oportunidade para lanchar um pão de queijo também. Pasmem: não comi nada do tipo. No sábado, um máximo um queijinho. Fim.
Dia 5
Foi difícil, foi. Foi louco, foi. E também foi uma experiência ímpar, pois percebi que a vida vegana não é impossível. Pode ser complicada; pois nem sempre há opções vegnas na prateleira do supermercado ou estabelecimentos especializados que concentram produtos do tipo. Exigente, porque demanda pesquisa, ligações para o SAC de empresas e checagem de rótulos dos mais variados tipos de produto. Tudo isso para garantir que não há algum bichinho na composição, nem foi testado no mesmo – ou seja, morto para a fabricação de sapato, rímel, queijo e até pasta de dente.
Além disso, a vida vegana pode ser solitária muitas vezes – se seus amigos ou colegas não seguem a mesma filosofia e acabam não embarcando nas mesmas opções que você. Contudo, conclui, acredito que o lado positivo pesa mais: além de não contribuir com a exploração animal, o corpo se sente melhor. Comia a cada três horas, descobria novos legumes (são gostosos, gente, sério: porque sou bem inflexível em experimentar novidades culinárias) a cada dia, minha pele ficou mais lisa que pêssego e o sentimento de leveza. Recomendo. Recomendo mesmo.
Tanto que, depois de quase um mês dessa experiência, penso sempre na quantidade de carnes ou laticínios ingeridos em cada refeição ou ao longo do dia. Se um dia me tornarei, eu não sei. Vegetariana talvez. Mas, posso afirmar que: minha alimentação não será a mesma.
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Texto: Manuela Mancilla
Vídeos: Caroline Luppi